sábado, 24 de dezembro de 2011

Um par.




Você me disse que, apesar de tudo, não me convenceu.
É verdade, ninguém ali queria provar nada,
era pura vontade de querer estampada em noite de quase véspera de Natal
na rua silenciosa,
como costumava ser.
Hoje ainda não estou convencida de nada,
você mesmo diz que repugna esses atos de convencimento,
a pessoa deve perceber sozinha o que seguir ou não seguir.
Eu sei que, depois de ter vivido e entendido,
tive a liberdade de escolher
e a sorte de você ainda me escolher.
E escolhemos nos amar mais uma vez,
em dia de quase véspera de Natal
ao som de chuva forte.
Escolhemos respirar fundo
com minha cabeça encostada no seu ombro
e você cantando músicas adolescentes.
Eu escolhi saber mais do seu passado escondido
e você escolheu uma maneira de dizer parte dele.
Juntos, eu posso dizer que formamos um par,
como letra e melodia,
sorvete de casquinha e tarde na Paulista,
Chico e Tom...
sofá e séries antigas
liquidificador e achocolatado
Vênus e Marte
tempo e amor.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O patinho ganhou acompanhante.




É engraçado pensar que seus momentos mais bonitos acontecem em anos pares. Já tentei entender porque fui mais feliz com 14, 16, 18, 20 e etc. (memória falha a minha, só lembro bem dessas idades...)
Pois agora, prestes a fazer 22 posso dizer que com 21 eu pude rever certos conceitos antes tão concretos na minha formação.
Minhas reflexões não serão longas como em todas as vezes que penso sobre o meu aniversário, justamente porque com 21 anos aprendi que é preciso ser conciso em tudo, até nas lembranças.
O amor simplesmente me apareceu de forma calma e madura aos 21 anos,
minha paixão por literatura resolveu me presentear com reconhecimento,
minhas ideologias foram questionadas com êxito e cansaço,
minha visão de mundo desconheceu minha miopia infantil,
minha saudade, antes absurda e urgente agora se abre em sorrisos pelo que eu vivi e não pelo que eu deixei de viver
minhas histórias, notícias, noites mal dormidas foram compartilhadas com uma rapidez impensável e uma animação embriagante
e
minhas dúvidas sobre o futuro foram esclarecidas em tarde de domingo no churrasco em família.

Com 21 anos, tornei-me adulta pelo fato de ganhar vontade de viver.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Diabo de passado.




Amanheceu e mais uma vez estou desacreditada de minha falta de coragem. Após ler nos romances aquelas mocinhas bem casadas em suas vidas cor-de-rosa, mais uma vez me deitei sonhadora e estou mais prostituta do que nunca.
Você deve pensar: “O quê? Uma prostituta que sabe ler? E prostituta lá sabe alguma coisa? Tem uma serventia e um destino: dar prazer em uma cama. E só”.
Pois eu digo que sou prostituta e sei ler. Aprecio romance francês, sei quando o filme é bom, sei quando ou jornal é sério porque aprendi a ler aquele que presta, mesmo sabendo que no fundo nenhum é digno o suficiente de leitura assídua.
Por conhecer todo tipo de conversa, das rudes às bêbadas que se dizem apaixonadas, sei também quando devo acreditar ou não. É preciso ver a cicatriz para lembrar o quanto ela doeu e na minha vida de meretriz, cicatriz de “amor” é como a sobremesa do banquete. Resolvi ser o que sou por causa dessas marcas que esticam a pele até estourar. Quando vi, minha coragem de ter futuro brilhante estacionou e com contas à pagar, resolvi seguir a sina.
Você insistiu e eu vou te contar o que eu acho do amor, mas antes eu preciso relatar a minha história. Ah, você quer ouvir? Então, seu pedido é uma ordem.
Eu era menina-moça com os meus 16 anos e ele moço-homem com seus 20 e poucos chegado do cais. Meus olhos bateram naquela pedra e me deixei levar por aquelas espumas brancas em forma de mãos, ele percebeu que a correnteza me puxou e aproveitou para enganar-me com canto de sereia. A vida era tediosa, eu ajudava meu pai de manhã com a pescaria e ia embora para a escola de tarde. Escola de meninas, minha única oportunidade de ser apreciada era no cais...logo no cais.
Desde que o vi, minha razão era encontrá-lo diante daquela paisagem digna de livros baianos. Arrumava-me toda, passava brilho no cabelo, escolhia a roupa mais curta e mais branca para contrastar com minha pele morena e ele me olhava com aqueles olhos de camaleão que mudavam de cor de acordo com meu calor.
Um belo dia, aflito de perceber minhas tantas saias rodadas diante de seu barco, me apontou uma pedra distante em formato de flecha, eu atendi o recado e fui em busca do instrumento perdido para o cupido fazer a parte dele. Lembro-me como ele veio com o rosto assustado: “Você é louca menina?” e eu respondi com uma certeza impossível de se ter aos 16 anos: “Estou apaixonada por você”, “E você sabe lá o que é isso?” “Sonho contigo, quero ficar contigo, você me olha com paixão.” “É certo que você me encanta, mas as coisas não são assim. Vou-me embora daqui uns dias, e aí, menina?” “Vou contigo, nada me prende aqui.”, “Como não? Você parece moça que sabe as letras, que sabe os números, o que vai fazer comigo?”. Depois dessa pergunta, eu resolvi dar um basta e ordenei: “Fica comigo. Pelo menos uma vez.”
Agora, reproduzindo o diálogo, eu vejo como foi inusitado. Percebi que o medo foi embora de suas palavras, pois ele chegou perto de mim e tirou a flor de meus cabelos, colocada para realizar o sonho de alguém arrancá-la de mim. Encostou os lábios no meu rosto como se sentisse o gosto de mar, e devia sentir mesmo. Suas mãos rudes encontraram minhas costas cobertas de suor nervoso e seu peito forte encontrou o meu gelado. Ele me amou como os amantes que eu lia nos livros bonitos. Ninguém nos via, não se ouvia som de mar...e o tempo resolveu descansar, assim como a minha espera.
Acordei com ele do meu lado e com o céu estrelado de verão. Meu irmão dizia que as estrelas tinham nome, desses que a língua já não sabe mais, decidi escolher uma estrela para cada sensação que aquele homem tinha me dado.
Até que ele acordou.
Sua pressa matutina de ir embora era maior do que seu fogo noturno, disse que precisava ir, a pescaria era responsabilidade dele, “acabei dormindo demais!”. Sem pensar no acontecido, me deu um beijo no rosto e disse para eu procurá-lo amanhã, como se ele precisasse dizer.
Ain, me desculpe, você pediu para eu contar de como eu comecei nessa vida...e agora eu to aqui toda chorosa, você não pagou para me ver feia desse jeito...mas uma vez eu li numa poesia que a noite e a bebida fazem a gente ficar igual diabo e aí, querido meu, o diabo é o meu passado...você não se importa, não é mesmo? Provavelmente não quer voltar para casa, pois sua vida não é nada interessante. Pois bem, continuo sem você precisar pedir.
No dia seguinte eu fui até o cais e ele me atendeu com delicadeza, ali eu achei que tudo sido bem verdadeiro, pois ele me encontrava depois do trabalho e fazia questão de me amar muitas e muitas vezes, tudo em um silêncio provocado, já que meu pai não sonhava que os passeios depois do colégio eram para encontrá-lo.
Um dia, ele não me recebeu com beijos nem abraços, disse que a gente precisava conversar e o escambal, anunciou sua partida e calçou seus sapatos. Minhas juras de amor não emocionaram e ele ainda afirmou com toda a sua covardia de homem: “Você se deitou comigo por tentação. Não tem Deus no coração. Achou que eu ia me casar com você? Vou me casar na igreja, com uma mulher que preste.”
Há, você dá risada, não? É, a sina deu certo...fiz da minha vida uma tentação.
A religião do marinheiro me fez puta.
Não sinto raiva dele, sei que eu era criança e que meu amor poderia acabar um dia se eu seguisse viagem, eu só não gostaria de encontrá-lo novamente e sendo prostituta a chance de isso acontecer era bem pequena. Apesar de todo dia achar que ele vai aparecer por essa porta e me falar que o casamento é uma droga.
O que eu penso do amor? Acredito nele. Eu leio bastante sobre essas divagações para saber logo se é ou não o que eu to sentindo. O amor construído, aquele nascimento de mãos dadas eu não conheço muito, me acostumei ao amor dos pés entrelaçados.
O que me deixou mais triste foi o marinheiro achar que meu amor não era puro. Eu o amava com o meu corpo, minha parte terrena e real, o amor concreto e revestido de suores e sussurros. Após o término do amor explodido, me deitava em seu ombro e sentia o tempo se misturar com a brisa calma. Esse meu amor era clássico, apesar de a descrição dele não estar em nenhum livro sagrado.
Ele mesmo disse “você é moça que conhece as Letras” e sei mesmo, sei que existem certas pessoas que não questionam algumas coisas, vivem de uma forma rasa e são felizes, ele era assim. Teve aquela formação comum e com pensamentos limitado, eu já não podia fazer nada.
Cheguei a conclusão de que aquilo foi amor, pois quando falo dele, é um relato longo e os detalhes são bem bonitos, ao contrário dessas minhas histórias cotidianas que duram até o último orgasmo. Você sabe que é assim, né? Não se sinta mal. Você vai voltar para a sua casa, provavelmente passará o sábado com os amigos, no domingo vai para o futebol...e vai me ligar na outra sexta-feira de novo.
Minha fala começou a ficar séria demais, não é mesmo? É que o efeito da bebida já passou faz um tempo, então começamos a escolher um pouco mais as palavras.
Eu devia suspeitar que você ia acabar dormindo depois de tanta baboseira. No fundo, você não quer saber se existe amor ou não, se ele é o sentido da vida ou não, você só queria uma boa história antes de dormir.
Sabe, você é bem bonito quando adormece assim, ainda mais com essa luz que entra pela pequena abertura da janela e faz sua pele ter mais curvas e cor. Uma pena que quando acorda, esse meu encantamento provavelmente vai embora junto com o seu amor de uma noite. Procuro entender que sua gratidão tem preço e não tem amor maior do que você dar dinheiro para a pessoa se alimentar, comprar suas vontades, pagar seu teto.
Depois que meu amor bonito acabou, sinto amor por mim mesma. Quem ama passa por cima de razões e começa a compreender melhor os princípios para poder viver esse “amor”.
Eu faço isso hoje, amo-me como nunca, pois durmo com a vontade de acordar no dia seguinte. Meu amor não é contraditório como as paixões terrenas que despertam dúvidas e delírios e não vou definí-lo como perfeito nem sublime.
Meu amor existe porque é meu. É o meu querer independente, minha falta de ar, meus gemidos, minhas realizações plenas e descansadas.
A vida me fez aprender que o amor, diferente da felicidade, não deve ser compartilhado.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Os cravos no jardim.




Os filhos.

É uma época difícil. Eu quase não saio de casa, apesar de estar na idade de passear. Vou para a escola e quando volto, minha mãe me abraça dando “graças à Deus”. Passo boa parte do tempo estudando, mas ainda não sei direito para quê. Outro dia eu fui perguntar para o professora qual era o motivo para aprender aquilo tudo, ela apontou para o quadro em cima da lousa: “Porque o excelentíssimo quer assim.”

Minha casa não é muito bonita, mas eu gosto de passar o tempo todo nela. Minha mãe é professora e me educou. Me ensinou as letras, as contas e a história. Diz que a escola vai me emburrecer. Mamãe não sai de casa também e para comer ela precisa ficar acordada até de madrugada, quando a vovó aparece e entra pela porta dos fundos. Não conheço meu pai ainda, minha mãe falou que ele foi embora para salvar o país. Ele ainda não voltou, mas eu sou feliz mesmo assim, porque eu sei que existe vida além do mar.

Eu adoro o colégio. Lá é tudo limpo e organizado. Todo dia aprendemos como respeitar os outros, como o nosso pais é poderoso, como devemos manter a paz e como somos íntegros. Aprendemos a pensar no futuro também. Foi lá que eu aprendi a escutar e obedecer. Meus pais falam que a coisa mais importante do mundo é ter orgulho de sua pátria.


Os pais.

Todo dia eu rezo sem parar. É ele colocar o pé para fora de casa e meu coração dispara. Apesar de só ter notícia boa na televisão, eu sei que acontece muita barbaridade. Meu marido trabalha a noite e sempre vê alguém sumir do nada. Não podemos contar isso pro menino, ele já tá grande, vai começar a entender. Outro dia ele me perguntou quem era ele, eu disse que era o dono do país, ele respondeu que não tem essa, que o país era de todo mundo. Dei-lhe um tapa que ficou quieto na hora. Comecei a rezar mais ainda, ele não podia começar a ter ideias diferentes. Deus me livre se sumisse também.


Sou professora e tive meu filho no meio do caos. Sei como as coisas são e decidi não mentir em nenhum momento. Ensinei tudo para ele saber exatamente o que lugar em que vivia para aprender a lutar quando chegasse a hora. Podem me chamar do que quiser, mas me recuso a viver nessa paz de merda. Meu marido não está fugido, está lutando para mudar. Meu filho sabe que o mundo será melhor quando ele olhar para a frente e não ver só o mar.


Minha casa é um poço de felicidade. Meus filhos são obedientes e sabem o valor da mulher e do homem na família. Sempre concordam com a gente, pois respeitam os mais velhos. Ensinamos que aqui é melhor lugar para se viver, pois o mundo todo está em guerra e nós gozamos de infinta paz. São os melhores da escola, pois sabem que quem tem educação de qualidade será um homem de sucesso, digno e culto.


O que há de comum em todas essas casas?

Os cravos no jardim.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

A arte de quem ama.




Quando resolvi ser sincera comigo e comecei a pensar de forma menos vazia.
Quando aceitei algumas impaciências diárias e percebi o valor das minhas opiniões
Você apareceu com aquele jeito “de vez...
para ficar.”
Talvez a minha confissão seja mais uma maneira de agradecer do que um estudo espontâneo sobre o amor.
Talvez a poesia saia decorada e bonita e eu me dê por satisfeita, por ser feita com verdades, independente se são diurnas ou noturnas.
Ou talvez eu pare de escrever nesse exato momento, pois sei que você vai me abraçar e jogar a folha longe porque agora é “hora de namorar”
Minha sabedoria consiste em afirmar a longa duração dos relatos sobre esse novo ser que ama.
É somente um jeito de tentar entender essa coisa amada,
que junto de mim,
se torna realidade digna de ensinamentos.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Boa Vinda.




"Foi na terça e na quinta-feira"
A pressa à margem do cheiro ruim
se deixa correr disfarçada de ar gelado
nos desenhos bonitos das estrelas voadoras
refletidas no rio, no vidro, no espelho.
Um lugar que de tanto existir
hoje já parei de imaginar.
Te assustei no início com tamanha indiferença
e me recusava a entender imensa adoração.
Ninguém é capaz de amar só pelas palavras
e foi assim que desisti de não te gostar.
Meu muro feito de mar salgado, assim como seu exílio,
se desfez quando eu soube o que você cantava.
Você pede benção e se assume alegria da casa...
Pois eu também peço a minha e faço a sua poesia
anfitriã do nosso lar.

domingo, 14 de agosto de 2011

Porque és tu.



Não sei a melodia que tocas no teu violão surrado, nem imagino o que passa por entre teus dedos vivos ao tocar nas cordas. Não faço ideia da partitura que crias ao me ver e nem procuro descobrir se fechas os olhos no meio de uma canção.
Não sei se tu preferes me (re)conhecer através de meus escritos tortos ou a partir de meus olhos protegidos.
Eu sei compreender o que tu falas, pois aprendi a respeitar teus pensamentos. Me surpreendo quando descubro um homem mais bonito do que aparentas ser. Meu medo de parecer infantil diante de semblantes duros ainda desperta um susto escondido quando não te vejo.
Ao mesmo tempo, tu falas com carinho frases que acalmam sem eu pedir. Falas que afloram uma sensualidade natural e uma força invejável.
És, hoje, o motivo de minhas dúvidas corriqueiras e minhas vontades absurdas de sonhar alto e realizar plano.
Tua voz, quando realmente presente, é o descanso em forma de sono acordado.
És o repouso e a felicidade de uma "volta pra casa".

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Agradar





Ela não o esperava numa quinta à noite, apesar de estar de férias, e, apesar de ser inverno, ela estava de camiseta rasgada na gola com o ombro à mostra, mas ele veio com surpresa e frases simples: “Ta em casa? To indo praí.”
Perdeu a vergonha de ser desleixada, com o cabelo amarrado num coque nada firme e a franja oleosa caída sob as lentes engorduradas. Encontrava-se com os pés na mesa do centro e o telefone do lado, o que revelava uma imobilidade preguiçosa desde que ele anunciara sua visita.
“Desculpe, nem me arrumei para te ver.” Ela disse com os olhos para cima, passando a mão no cabelo e se ajeitando no sofá.
“Você fica bonita com roupa de ficar em casa.” Ele disse dando um beijo de “boa noite”.
Ele sentou e arrancou o tênis, nos pés, meia-social preta.
“Veio direto?”
“Só passei em casa para tirar a gravata”
Ela o olhou com um sorriso de lado que representava uma expressão “Eu podia fazer isso pra você”. Ele entendeu, visto que deitou ao seu lado de bruços com rapidez. Quando fazia isso é porque queria um carinho.
Ela mexia os dedos e escutava as unhas deslizarem pelas costas dele, enquanto na outra mão segurava um livro grosso, lia atentamente, apesar da aparente fraqueza nos olhos. De repente, a mão da massagem parou.
Ele levantou a cabeça e percebeu o cansaço em forma de sono bom. Ergueu o corpo e a segurou. Acordando, resmungou: “Ain, dormi!” e ele, só com gestos, a colocou junto de si, como quem abraça.
Ela não ousou recusar o colo.
Depois de um tempo, ele olhou o celular e a acordou: “Preciso ir embora.”
Ela tinha uma mania de agradecer por tudo. Agradecia pelo sorvete que ele comprava, pela companhia no cinema, por erguê-la durante o show para tirar foto...e para não perder o costume, exclamou: “Obrigada.”
Sobrancelhas franzidas, ele retrucou: “Não é pra agradecer pelo colo, mas que coisa! Pára com isso, você é minha namorada.”
Ela sorriu, sonolenta e paciente: “Ué, e quem disse que eu to agradecendo pelo colo?”
Os dois riram, se beijaram e se despediram.

With a love like that
You know you should be glad

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Desejos...



É tempo de começar a sonhar.
É tempo de pedir para amar.
É tempo de querer enriquecer.
E tempo de escolher
entre amar, sonhar ou enriquecer.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Eu não me chamo Raimundo



Você já parou pra pensar em quantas vezes já pensou nisso?
E então, a noite veio, você chorou um pouquinho e pegou no sono.
Não há nada de errado em ver os dias passarem ensolarados
o errado é deixar o calor não te queimar ou te secar.
Quantas vezes você já me disse: “Tudo mudou!”
e aí você gritou gol, a cerveja gelou, a mulher te chamou...
Não acho errado sonhar ou desejar,
mas eu prefiro viver em um mundo silencioso, desconhecido de ignorâncias
do que viver falando o que eu faço ou deixei de fazer
e a cretinice concordar comigo.
A distração existe e ela quebra toda a convicção de um ser solitário.
Deve ser por isso que parei de me importar se está bom ou ruim.
A genialidade nunca foi efêmera.
Ao contrário dessas páginas rasgadas que doem a vista.
Estamos salvos, pois a única coisa arriscada hoje em dia
são amores mal resolvidos regados a bebida barata
Passado revirado com direito a citações desconcertantes
e política infantil com exploração de falta do que fazer.
Não fiquemos preocupados,
nossas crianças ainda vão aprender a rimar.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Trabalho Final




“Larga esses livros e vem pra cá.”

Ela não saberia explicar a doçura dessas palavras tantas vezes esperadas após um dia cheio de palavras difícieis, “bonitas” até. O fato é que tudo pode esperar quando não se tem tempo. Até o amor.

“Você disse que ia largar esses livros depois da meia noite. É sábado!”

Ela sabia que com isso a paciência ia se esgotando e o leite ia esfriando, mas estava envolvida de tal forma naquele passado criado que o presente era mera desculpa. Acordava já pensando em como escrever tal passagem, em procurar em tal livro. Tomava banho cantarolando músicas da época, usava óculos para a sua miopia forte, mas só enxergava branco e preto.

“Eu te atrapalho se pegar o violão?”

Ela afirmou que não com a cabeça e ele pegou o violão. Infelizmente a concentração era tanta que nem sabia distinguir qual música ele tocava, apesar de ele tocar praticamente umas 18 vezes a mesma música. Ela ria sozinha com curiosidades da sua pesquisa- como o a marca do perfume que seu objeto usava - e ele a olhava com um certo ar de braveza, pois por mais que ele perguntasse o motivo da risada, ela não falava.

“Você vai me trocar mesmo hoje?”

Ela o olhou por cima dos óculos e ele entendeu bem o recado. Pegou seu violão – o amigo que não abandona – e foi para o quarto enquanto ela continuou na sala com a sua barra de chocolate e o copo de groselha. Olhava no relógio e percebia o domingo chegando e sentia que seu lema de “não estudar aos domingos” ia se quebrando. Quando finalmente digitou a última palavra, já via o sol nascer com graciosidade e chegou a pensar em aproveitar e simplesmente não dormir, mas não fez isso. Salvou o trabalho e escreveu um bilhete: “Terminei. Você pode dar uma lida pra mim? O nome do arquivo é “trabalho final” e eu não aceito observações do tipo: tem um erro de português ali...”

Ele acordo e percebeu o sono profundo em que ela se encontrava. O cansaço era visível pela respiração pesada e pela boca meio entreaberta. Por mais que condenasse essa interferência ousada de suas vontades profissionais na vida dos dois – o que ele controlava um pouco – gostava de vê-la assim ativa e feliz quando descobria algo novo. Como ele mesmo disse uma vez: “temos uma vida literária, musical etc...”

Leu o trabalho, apontou os “erros” ou “acertos” e esperou ela acordar tocando violão.
Apesar de todo o silêncio, de todas as noites arrastadas, de toda a falta de companhia mesmo presente...

era pra ele que ela entregava a sua confiança.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Máximo de vida.





-Mãe?- Ela perguntou com a esperança de dessa vez escutar alguma coisa a mais,
mas a mãe continuou de olhos fechados e respirando fundo, como se o sonho tivesse tão bom que ela não quisesse acordar.
-Mãe? Você ta com fome? - Ela tentou mais uma vez.
Não obteve um ruído.
A mãe passou meses assim, com o mínimo de saúde e o máximo de vida.
Às vezes chegava perto só para sentir se o coração ainda batia, já que sua respiração ela escutava de longe.
O fato é que vivia e sonhava e não respondia.
Parecia que a vida se esvaía do corpo a cada tentativa frustrada de abrir os olhos, comer, tomar banho, dar um abraço.
O tempo de viver pode se prolongar e não se sabe muito bem porquê.
Será que ainda há motivo para sorrir? Será que falta uma despedida decente pra acontecer? Será que ainda se pode ter força para escrever?
O filme da vida já passou e despassou pela frente diversas vezes e o som do sino toca diariamente,
mas ainda é possível sentir sede e pedir por água.
Por enquanto, a morte chega e em vez de separar para sempre
segura nas mãos do corpo e da alma.

domingo, 19 de junho de 2011

Atrás do arco-íris.




Muitas poesias foram perdidas durante este tempo.
Lembro que foi numa manhã fria de terça-feira, dessas que o vento dança por entre os prédios da famosa Avenida e se misturam no trânsito caótico da cidade que respirei fundo.
Uma profundidade irreconhecível após tantas tentativas de ar.
Ali comecei a tentar escrever sobre a mudança que é deixar de viver só com o pensamento e pisar no chão com sapatos sem cadarços.
Mas eu não consegui.
Tudo me pareceu tão óbvio.
Essa mania de se mostrar forte quando a fragilidade não é uma doença. A triste forma de usar palavras fortes quando o silêncio faz muito melhor esse papel. A inútil maneira de achar que o texto alivia quanto teoricamente só faz instigar.
Amputei-me de qualquer tristeza ao escolher o lado preto e branco da vida. Tudo parece mais rígido e eu me sinto mais cansada do que nunca com o meu relógio de marca...
mas não reclamo.
Minha satisfação é plena e eu a sinto com as mãos. Minha insatisfação é imperceptível e dura até meu despertador desligar.
Porém,
meus abraços ainda duram mais de cinco segundos, eu abro um sorriso quando vejo o dia surgindo no domingo, me surpreendo com o desânimo de Drummond e olho atenta para o braço do violão no começo de música bonita.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

vai fazer tempo.



Eu gosto quando chega o inverno e sua boca fica mais vermelha do que o normal, a pele fica pálida devido a falta de sono e suas unhas nunca estão bonitas,
mas eu começo a gostar de você mesmo assim.
Levantar todos os dias apesar de todo o frio, todo espirro e de todo o trânsito e a reparar em céu mais limpo, em traços mais infantis, em escritos bonitos, como se a única preocupação fosse não chegar atrasada,
mas eu já ganhei o direito a alguns minutinhos a mais na cama quentinha.
Sei que as coisas adormecidas quando acordadas podem te dar um arrepio, desses que você tem quando a coberta cai nos pés da cama às três da manhã,
mas minha preguiça sumiu com a idade e eu levanto e me cubro de novo.
Não saio daqui enquanto não me acostumar com a arte das ruas e cobertores pelos corredores
enquanto eu não me embriagar buscando a vida em noite de quinta-feira a preço de moeda de troco
enquanto o meu lar não existir.
E até lá, te observo de longe, sempre tão apressada, com a música violada nos ouvidos.

domingo, 1 de maio de 2011

Palavra "mágica"




"Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão"

Carlos Drummond de Andrade



Quando a gente é criança e se machuca
alguém pega a gente no colo e diz : “Vai Passar”
e você nem acredita na hora, porque o remédio ardeu bastante e as lágrimas não param de cair, mas aquela voz vem calminha e com o tempo você adormece e ainda escuta:
“Vai passar”

Então você cresce e parece que suas perguntas não tem respostas.
Seu corpo muda, você sente dores diferentes, dessas que não arde, mas dá umas pontadas.
Você arranja algo para se distrair, como um violão ou um lápis com papel.
E de repente você olha para o o teto do quarto com essas estrelinhas que brilham no escuro
e ouve uma voz baixinha antes de dormir:
“Vai passar”

Você espera ela no carro com o coração na mão, nervoso, sem saber o que a noite reserva
ela se arruma apressada tentando não errar na combinação da roupa
o encontro acontece lindo como tinha que ser.
Depois de um tempo
o carro já não está parado na frente da casa dela
e ela resolveu mudar de emprego pra não encontrá-lo mais.
Às vezes, quando está andando na rua, ela o vê passar de carro.
E ela fala no seu pensamento:
“Vai Passar”

A tosse não passou de uma hora pra outra
e o remédio estava em falta na farmácia.
Não dá nem tempo de se despedir como nos filmes bonitos
mas a vida não imita a arte, só dá uma noção de como ela deve ser.
E no meio de toda essa falta de adeus
alguém segura a sua mão e diz:
“Vai Passar”

Sua gravata anda apertada demais e as horas passam bem devagar até a hora do almoço.
Nos acostumamos a ter companhia mesmo sem ter presença
a ter esperança de sempre caminhar mais mesmo parado.
e quando a expectativa chega, mas a alegria não
já hora do almoço chega e você está atrasado.
“Vai passar.”

Você chega tarde da noite e sobe de elevador
você acorda e ele ainda está no seu andar.
A mesa está no mesmo lugar e na pia só tem uns copos a mais para lavar.
Você dorme e antes pensa: “Não dá nem tempo de descansar”
e uma voz dorme junto de você.
“Vai Passar”

Entender a vida é diferente de vivê-la
e passamos boa parte dela imaginando o que poderia ter sido, mas não foi.
A liberdade de sentir as coisas seria mais simples e menos dolorosa
se o futuro não fosse tão preocupante
porque ele também vai passar.


Eu posso não saber muita coisa ou de nada até
só aprendi que o tempo e o amor quase sempre não andam juntos
mas um dia ele se encontram
e aí você começa a escutar uma voz diferente
que diz:
“Não, isso não vai passar.”

domingo, 24 de abril de 2011

Laços desfeitos.




Será que eu me acostumaria a ter raízes em apenas um lugar?
Acostumada a ouvir insultos por ser egoísta começo a aceitar esse meu jeito medroso de não querer me depender de ninguém.
Passei boa parte da minha vida não tendo domingos na casa da vó
nem dia das crianças com primos.
Como eu faço para mudar essa visão limitada de que eu consigo viver só, sem um sorriso infantil por perto ou alguém para me contar histórias de minha infância?
Sinto que perdi minhas raízes a partir do momento em que resolvi voltar para minha terra natal.
Contraditório, não?
O fato é que não sei se sinto inveja ou alívio.
Eu já esqueci essa coisa de sentir saudade e aceito a morte como algo inevitável.
Não vivi o suficiente para ter o amor assim: estampado, registrado, explícito.
Talvez só quando eu ver as crianças crescerem.
Crianças essas que nem lembrarão um dia de mim.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Tempos de escola.




A minha escola era até um pouco parecida com essas de filme americano, mas não tinha líderes de torcida. Tinha time de futebol, mas ninguém levava muito a sério. Uma vez me chamaram para fazer parte do time de handball e eu fiquei realmente empolgada, mas minha mãe vetou qualquer possibilidade quando soube que os jogos eram no horário das aulas. Não fiquei com grandes traumas, mas hoje me pergunto porque não gosto de ver jogos de handball pela TV.
Me vetar do time de handball não me ajudou tanto assim nas notas. Nunca fui a aluna menos inteligente da sala, eu sempre conseguia passar raspando, ou ficava de recuperação por dois décimos e me passavam, mas isso só nas matéria de cálculo. Lembro-me uma vez que eu tinha faltado na aula por estar doente e recebi uma ligação de uma amiga falando que fui a única do segundo ano a tirar 10 na redação sobre “A Ilha das flores” e, pra você pode ser bem idiota isso, mas pra mim foi demais. Na semana seguinte, minha professora veio me falar que fui a única que tirei 10 na prova de literatura e me senti mais feliz ainda. Ganhei o ano com isso, aliás, mas só era “boa” nisso também, o que não me ajudava como um todo em todos os anos de colégio.
A minha escola era enorme, mas tinha uma biblioteca pequena e eu não me lembro de nenhuma vez ter visitado o laboratório. A sala da diretora era cheirosa e eu fui pra lá uma vez quando risquei a porta brincando de jogo da velha. Fizeram o maior alarde falando que eu ia pintar a porta, pagar a tinta e o escambal. A única coisa que eu pintei até hoje foi a parede do meu quarto quando eu fui morar sozinha. Aliás, eu era a maior medrosa, era só a professora levantar um pouquinho a voz que ficava dura na cadeira, mas isso não impedia de passar bilhetes do tipo “escreva uma frase com 5 palavras e continue a história”. Esse era o “SMS” da época.
A minha escola era branca e azul. Os azulejos eram bem limpos e as carteiras tinham um estofadinho. Eu nunca entendi aquele estofadinho até ir para o terceiro ano e passar quase 10 horas sentado nele resolvendo exercícios de vestibular com mais 150 pessoas.
Eu tinha 10 anos quando comecei a usar óculos, 13 quando escrevi minha primeira poesia, 14 anos quando comecei a usar aparelho, 15 anos quando comecei a gostar de Legião Urbana e 17 quando passei no vestibular pela primeira vez. Minhas roupas eram monocromáticas e meus tênis possuíam cadarços florescentes. Minha maior alegria era ir ao shopping de sexta e comer pizza aos sábados.
A minha escola era localizada num dos melhores bairros da cidade, tinha padaria nobre perto, shopping bem equipado quase na esquina e restaurantes baratos em época de vacas magras. A torta dois amores verão me fez engordar uns 6 kilos e o uniforme preto e branco me fazia emagrecer uns 3.
Eu nunca fui namoradeira, aliás, eu não tinha tanta beleza pra tanto e gostava de um menino que só queria ser meu amigo. Típico da idade. Hoje esse mesmo menino já tentou ficar comigo várias vezes mesmo nas circunstâncias erradas. Chegamos a dividir o mesmo copo de cerveja na faculdade, eu fui ouvinte de burradas que ele cometia e ele foi meu abraço de saudade de casa por muitas vezes. Aquele encanto adolescente foi embora, mas a amizade continua a mesma e ele continua sendo lindo, apesar dos kilos a mais.
Hoje me pergunto como estão os professores, a diretoria, os inspetores, a bibliotecária, o pessoal do fundão, os inteligentes, as patricinhas (que eram muitas). Todos se surpreenderiam (ou não) por saber onde estou hoje e como estou, mas prefiro que não saibam, a timidez colegial ainda não saiu completamente de mim.
Gostaria de voltar só para sentar na quadra em um dia de sol e conversar sobre as incertezas de um futuro que parecia não chegar, mas agora já chegou e passa rápido demais.
Ser professora depois de ter sido aluna durante um bom tempo me dá uma certa saudade de saber que sobrevivi e uma certa agonia por saber que o tempo não anda tão generoso comigo.
O que me salva é saber que ainda posso compartilhar certas lembranças com os amigos que ficaram e que apesar de poucos, fazem esse passado todo fazer algum sentido. Por causa dessas lembranças, resolvi não sair desse universo, só mudar de lado.
Bem ou mal, vai depender da nota da redação.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Cadê?





Quando você pensa que já tem histórias o suficiente para contar
a memória falha com o acúmulo de tarefas controladas.
O tempo vai deixar para trás aquele verso que me fez sorrir
Virão outras melodias, outras formas de carinho
e a ideia de querer é cada vez mais forte.
Querer esquecer realmente faz esquecer.
Querer esperar não faz o tempo passar.

Então, você lê poesias antigas para ver se ainda tem um resquício de lembrança
e chora por só ver palavras sem ritmo ou história sem final.
O que aconteceu com a menina que gostava do passado?
Cansada de não entender aquelas canções bonitas
se vê presa a dormir com fones de ouvido.

Ah, você chega tão de mansinho debaixo do cobertor
ou chama pela moça de oclinhos bem baixinho
Me falaram tanto da pérola que é difícil achar
e ela me veio sem eu precisar procurar
Penduro nas orelhas, no criado-mudo, no meu coração
e se um dia eu perder de novo essa vontade bonita, a bossa-nova esquecida, a poesia novinha, a espera contínua, a alegre nostalgia...

Você acha
e me devolve.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Minha alegria.




Deixa eu imaginar...

Pega ali o tambor e vem aqui pra pertinho de mim.
Fala qualquer coisa no microfone e faz uma anotação no papel
ou pega aquele filme bonito e faz pipoca.
Segura bem o suporte da televisão que eu vou ajeitar o cabo da TV a cabo
ou fica aí rindo graciosamente enquanto eu me mostro desajeitada.
A gente sonha de verdade quando tá dormindo
porque as preocupações viram poeira de asfalto
e o amor paira na música do sobrado, meu amigo.
Eu sei bem o que é andar andar andar e mesmo assim ter que voltar.
Mas a gente fica bem quando o encontro vale o passeio
e chega em casa com vontade de cantar.
Resolvi escrever essas coisas bonitas
para espantar essa choradeira
e quando eu terminar de ouvir a sua música.
a tristeza vira poema.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Fim de soneto.




Eram 6 horas da manhã quando resolveu juntar as suas coisas mais íntimas e bonitas. O pensamento era mecânico e objetivo, pois se parasse para questionar tudo aquilo, dormiria e esperaria o dia amanhecer, trabalharia, estudaria e assim seguiria com a distração comum dos ponteiros fluorescentes.
A explicação pra tudo isso é bem óbvia. Cansada de acordar sem motivo, se viu obrigada a aproveitar o tempo de uma maneira melhor. Juntou um bom dinheiro para uma coisa que acabou não acontecendo e era hora de gastá-lo sem muitos questionamentos.
Juntou algumas roupas, blocos de anotações e elásticos de cabelos. Levou o celular também, mas sem créditos ou conta, só para ouvir música. Não desceu a escada na ponta dos pés nem deixou bilhete de despedida. Não era uma fuga, era um passeio sem uma possível volta. Apenas isso.
Fechou a porta e levou as chaves, foi até a estação de trem para pegar o ônibus.
Foi a primeira vez que saiu de casa.
Três anos depois, ela trabalhava em um bar e estava no último semestre do curso para ser enfermeira. Sua rotina era tão puxada que nos finais de semana ela dormia quase sem parar. Ela dividia o apartamento com uma menina, mas quase não se viam. Sempre guardando dinheiro, ela passava os dias falando, andando, se comportando de forma estúpida propositalmente. Engolia sapos e sentia raiva do trânsito, conversava sobre sexo como se soubesse muito do assunto e assistia à novelas comendo pipoca. Em um feriado de páscoa, guardou todos os seus livros em uma mochila e um pouco de roupa na outra. Deixou o dinheiro do aluguel adiantado e fechou a porta com força.
Foi a segunda vez que saiu de casa
Quatorze anos depois, ela já estava casada, mas sem filhos. Casou-se com um saxofonista que conhecera no bar que trabalhava e a casa deles era cheia de alegria. Seu marido pintava notas musicais nas paredes e deixava sempre um versinho de Vinícius em cima da mesa de jantar. Sua coleção de filmes se espalhava pelo chão junto com os lençóis manchados de vinho. Nunca mais soube notícias dos pais, nem pretendia ser mãe, mas era feliz pelo simples fato de ter algo para criar, esse algo abstrato, mas sentido de todas as maneiras.
Um dia olhou em sua volta e percebeu a luz do sol entrando pela fresta da janela. O sol ardeu os olhos e arrepiou a nunca. Ela percebeu como a cortina estava suja e seu porta-retrato empoeirado.
Arrumou suas malas.
Sentiria falta de muitas coisas, mas de uma especial, de seu marido dizendo: “Você me tirou a solidão.”
Foi a terceira vez que saiu de casa.
Ela segurou aquela criança com lágrimas nos olhos. Imaginou um rosto limpo e nariz arrebitadinho, cabelos negros e olhos grandes. Imaginou uniforme escolar e primeiro choro de medo do escuro. Pensou na agitação do primeiro amor e no choro infeliz da primeira nota baixa.
Depois de tudo isso, entregou-a para mãe emocionada. Saiu da sala de parto, foi até o banheiro e soltou o cabelos. Olhou-se no espelho, tirou o jaleco de ajudante e guardou no armário.
Resolveu sair do hospital e ir até o bar que o marido tocava.
Ele estava bonito, de terno sem gravata e cabelo sem corte. Tocou baladinhas românticas, pois era quarta-feira e em dia de semana ele não tocava sax, só violão. Ela sempre achou que ele tocava violão muito melhor do que tocava sax, mas ele não acreditava.
Observou de longe, cantou junto com ele, fechou os olhos no momento dos solinhos e deu um tchau tímido: “Se você soubesse o quanto você me fez feliz”. Pensou sorrindo.
Chegou em casa, tomou banho e dormiu.

“E ir conjugar o verbo no infinito”
Era a frase que ele mais escrevia, mais cantava, mais dizia perto do seu ouvido.
Sem saber que a frase que ela mais gostava era: “Que seja eterno enquanto dure.”
E assim, ela se sentia em um mundo.
Nunca em casa.

sábado, 26 de março de 2011

Sinais





"Eu sei que é impossível, mas eu queria tanto conversar com deus"
Antonio Marcos.



Estou com uma sensação
de que um dia
Deus vai desistir de mim.
Será impossível uma certeza plena de que a vida nos dá caminhos para seguir?
Ou eu calcei os sapatos apertados por pressa e depois eles não sairão mais dos meus pés?
Clamo por respostas que só vem a longo prazo e minha paciência chega a ser ridícula de tão normal.
Eu não tenho medo de errar, só tenho raiva por saber que no final das contas, mães tem razão.
Ou melhor,
que meu coração precisa ter razão.
Às vezes faz mal, outras faz bem.
No final do dia a solidão chega pra equilibrar os lados.
E Deus...
fala em forma de música em noite de lua minguante.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Começo Feliz.




Sinto falta de responder perguntas sinceras e criar diálogos dignos de filme diferente nos lugares mais bonitos da cidade. Esses diálogos que preenchem perfis de redes sociais e e-mails de amor. Não é uma saudade absurda e o jeito como eu ficava após essas conversas era lamentável, mas eu sinto falta mesmo assim. A gente acostuma, imagina, planeja, espera e quando vê, precisa dormir rápido, recuperar aquela nota na faculdade, se aprimorar no curso de idiomas, enfim...sei lidar bem com expectativas frustradas, só não sei lidar bem com saudade.
Maldita memória fraca que lembra mais dos seus olhos sisudos do que de suas palavras desconcertantes. Descobri algo importante sobre minha personalidade com você. Será por isso que estudo pouco o que eu preciso e mais do que eu gosto?
Sabe, vou te contar o lado “bom da solidão”: A necessidade de espaço e grandeza. Quando se está sozinho,você precisa de um sofá enorme, uma televisão boa, o melhor chocolate e uma avenida gigante cheia de pessoas diferentes só para observar. Aquela coisa, se você não dorme de conchinha, compre um travesseiro, se você não vai ao cinema, compre um DVD, se você quer se sentir bonita, compre roupas. É o preço de trabalhar muito e pensar pouco.
O problema não foi você ter ido embora ou me tratar como uma estranha ou eu falar besteiras na sua frente por nem pensar antes de falar. Talvez as consequências mais simples deviam ser evitadas, mas eu sempre deixei você escolher, não será diferente agora. O fato de negar já prova um sofrimento maior do que a vontade de lembrar algo bonito. Pior, o rancor faz as lembranças nem existirem. Uma pena.
Eu não nego e sinto falta. Apesar de não me arrepender e nem querer saber se você sente a minha.
Minha memória falha espera diálogos diferente no acaso feliz das grandes cidades. Quem sabe assim você não lembra de uma época em que a música ultrapassava o som das buzinas e as conversas tinham hora pra acabar, mesmo pegando todos os sinais vermelhos da avenida.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Flâneur às avessas.





"Passas sem ver teu vigia
Catando a poesia
Que entornas no chão"

Chico Buarque - As vitrines.

Coloquei uma música no pensamento e resolvi sair de casa só para observar.
Não era nem noite nem dia e apesar de estar na cidade caos do lado de cá da América dos sonhos, minha melodia não sofreu alteração alguma durante o percurso.
Descer ladeira, subir ladeira, virar a esquerda, pedir um açaí bem gelado, usar havaianas e fingir que eu estou na praia.
O começo baixo desse asfalto antigo me deixava curiosa. Talvez era a primeira vez que eu tinha coragem de aparecer por aqui depois de tanta resistência. Bem, quando se resolve mudar, é preciso começar pelo maior desafio. Prova bem simples e boba, eu iria pegar o trem de qualquer forma antes da meia noite e chegaria em casa sã e salva para ainda me empanturrar de bolacha Bono e ver Jornal da Globo como se tudo fosse novidade.
Eu sou uma menina, apesar de não aparentar. Cortei meus longos cabelos castanhos em busca de ar fresco na minha futura poesia e estava com a minha pior calça jeans. Pensamento bem idiota esse: “Não vou me arrumar para ir até o centro, vou só andar mesmo, tomar meu açaí e ir embora”. Se o amor da minha vida me encontrasse, gostaria de mim com a minha pior calça jeans. Tá, nessa parte eu fui irônica. Porque se você encontrar o amor da sua vida, acredite que mesmo assim, ele olhará pra sua calça jeans, mas não necessariamente para reparar se ela é velha ou não.
Levantei e não andei aquela rua a 120 por hora, como muitos. Aliás, eu estava no número 120 quando resolvi voltar pra casa. Já tinha escurecido e minha miopia afetada não me deixou escolha a não ser ir em busca de luz.
Prevalecia a rosa, azul e vermelha em forma de palavras com plural no aumentativo. Os prédios também eram coloridos. Fiquei me perguntando, se as pessoas tivessem a visão em preto e branco, o efeito seria o mesmo? Pra que tantas cores se o que eles fazem aí dentro a maioria das vezes é com o olho fechado?
Não quis entrar em nenhuma casa bonita, apesar de muitos homens puxarem o meu braço e me elogiarem com adjetivos comuns. Engraçado, as mulheres reclamam da falta de criatividade dos elogios masculinos, mas nenhuma delas ficaria feliz se recebesse um “vem cá, mulher meiga”. O legal é ouvir o habitual “Sua maravilhosa, vem me fazer feliz”.Brega eu sei, mas aumenta o ego, não adianta negar. Pelo menos na hora.
A mistura universal dessa capital chega a ser clichê de tanta evidência. Mulheres vestidas de oncinha (com rabo e tudo), mandam beijos para engravatados com a mesma normalidade que o casal adolescente atravessa a rua.
Eu não escutava ruídos e eu não parava de andar. O objetivo não era nem dar uma de psicopata e avaliar um por um para tentar adivinhar a história por trás das plumas ou das moscas. Simplesmente andar e pensar na hora “Que homem bonito”, “Nossa, repara naquele quarto com luz verde-limão”, “Quanto será que ela cobra”, “Porque dormir aqui se mais pra frente, você pode arranjar um cantinho bem melhor numa avenida bem maior?”.
Quando cheguei quase na ponta final da rua, estava um dos meus lugares preferidos. Seria o preferido se eu tivesse dinheiro, mas como eu peguei um ônibus, acabou não sobrando nada. Olhar aqueles títulos e lembrar dos nomes deles era um sacrifício pra mim que nunca me lembro do essencial, só dos detalhes. Era capaz de eu lembrar exatamente da capa, da espessura da caixinha, do nome do vendedor, mas isso não adianta nada no Google e eu ficaria sem obter informação alguma sobre aquilo.
Era quase dez horas quando cheguei naqueles semáforos piscantes e bonitos da rua mais querida da cidade (na minha visão). Resolvi pegar o metrô e passar uma fominha a mais só para comer aquela tal tapioca dos tempos em que eu era frequentadora assídua da linha vermelha.
Cheguei em casa, levei bronca por não dar notícias, tomei banho quente cantarolando algo como “nessa espera o mundo gira em linhas tortas”. Entrei na internet com a esperança de lembrar do nome do filme, mas não adiantou, como sempre.
Era terça-feira e eu trabalharia bem cedo no dia seguinte.
E aí, você me pergunta: “Por que você faz isso? Coloca um fone de ouvido e fica andando por aí, olhando pras pessoas, gasta um dinheiro à toa e depois volta pra casa e dorme?”
E eu respondo: “Ninguém nunca perguntou para um 'flaneur' o por que ele fazia aquilo. Não estou me comparando a um, longe de mim, até porque eu nem entendi aquele texto de Literários direito, mas de que adianta eu te responder? Eu poderia falar uma coisa bem filosófica e aí ficaríamos aí discutindo horas e horas e eu te mataria no dia seguinte por estar morrendo de sono. Eu poderia falar que fiz porque quis e você ficaria satisfeito. Eu poderia falar que não gosto de ficar na minha casa.”
Não falarei nada disso...faço porque a vida é muito maior do que o meu quarto e muito menor do que a minha solidão.
É o que eu sinto.
Só isso.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Somos tão jovens.

http://www.youtube.com/watch?v=vN7HQrgakZU&feature=fvst

É com você que eu imagino as cenas bonitas em câmera lenta com musica romântica.
Por imaginar muito,
minhas madrugadas são longas em janeiro.
Sem dinheiro, sem previsão do tempo, sem vergonha de pensar em um futuro que não vai chegar tão cedo.
Quando vou saber se o certo existe ou se o errado é melhor?
Maldita hora em que eu fui perder o medo.
Bendito dia em que minha boca se dissolveu em gritos rimados.
Eu tomei chuva porque esqueci meu guarda-chuva com você.
Espero todo mundo dormir para comer minha bala doce demais
e escrever com a surdez do meu quarto.
O título precisa de som?
Eu vou comprar uma escaleta para um dia fazer um pouco de vida mais bonita.
Voltar a escrever meus poemas curiosos.
Quem disse para eu ter forças nas pernas se eu posso fazer isso sem sair do lugar?
Minha redação não é boa,
mas se você quiser eu posso explicar o que eu quero dizer.
A desculpa é sempre metafórica, não é?
Sua memória me deixa sem graça
quando eu percebo que meus melhores dias ainda podem chegar.
Boa noite
antes que o futuro ou o dia ou só o pedido chegue.
E saiba que eu ainda escuto música românticas
só para te ver.

domingo, 9 de janeiro de 2011

Poesia Inacabada






Silêncio combina com fumaça de cigarro
e eu não fumo.
Se hoje eu ainda vejo o céu por trás de telas brancas
é porque meus olhos permaneceram quietos
enquanto tampavam o sol com essa cortina que não se arranca.

Música de cordas combina com dia de chuva
e eu não tenho nem uma sombrinha.
Se hoje eu não sei tocar violão
é porque minhas mãos são gordinhas demais
e sufocam a melodia na espera da chuva passar


Sacadas enormes e bonitas combinam com praia famosa
e eu moro na cidade grande.
Se hoje eu gosto dessas ruas largas e esse cheiro de asfalto
é porque eu perdi o chinelo no mar

Tempo arrastado combina com mente agitada.
E eu durmo mais do que o normal
Se hoje levanto nua
é porque minhas roupas já não me protegem mais

Ano novo combina com caneta nova
e eu nem tenho mais caderno
Se hoje escrevo com as pontas dos dedos
é porque minha poesia anda apressada.

A única coisa que não combina
é terminar uma poesia
e permanecer sentada.