quinta-feira, 29 de maio de 2008

"Ela faz cinema"


"o prazer de provocar admiração e a satisfação orgulhosa de jamais ficar admirado".
Charles Baudelaire


Ela fazia cinema. Ele era calouro das artes cênicas. Ele usava tênis "allstar" e camisetas coloridas, ela tinha uma bolsa da Marilyn Monroe magnífica e longos cabelos pretos. Brilhantes.
Paulo(ele) não sabia nada de teatro, queria ser ator para ganhar a fama, saiu do ensino médio assim como nênem sai das fraldas. Era legal a faculdade, você podia sair da sala sem pedir permissão.
Sophia(ela) respirava cinema, era fera em produzir filmes curtos, seu quarto era uma locadora. Clássicos, romance, ação, drama. Era presidente do centro acadêmico.
Primeira semana de aula, o cartaz no mural comunicava uma convocação para o novo curta que Sophia queria produzir. Paulo foi.
Vários testes, inúmeros estudantes. Uma única pessoa para escolher o tal protagonista.
Ele entrou. Ela o olhou:
- Paulo! Nome de ator. Será que você é o próximo Paulo Autran?- Perguntou, com os lábios levemente pintados.
-Paulo Autran? Não sei quem é Paulo Autran - respondeu com inocência. Uma qualidade, era sincero, não sabia e pronto.
- Você faz artes cênicas e não sabe quem é Paulo Autran? - O tom de voz agora era de impaciência. Seus lábos pronunciaram a frase devagar, contraditoriamente.
- Sinceramente, garota, eu não sei. - Chamou-a de "garota", logo ela, que detestava esse vocativo.
- Já entendi. Você não quer fazer teatro. Você só quer ser ator. - Olhava com uma seriedade particular. Mexeu nos cabelos, estavam presos.
- E tem algum problema nisso? - Apesar de todas as pistas da parte dela, ele realmente não sabia quem ele era...já estava incomodado. Como pôde parecer tão infantil diante da "garota", aqueles cabelos diziam algo que ele queria compreender.
- Não, nenhum problema. Aliás, esse é o ponto. Não tem problema nenhum e , simultaneamente, tem problemas demais - ela respirou fundo - Eu te mando um scraap, tá? Me procura no orkut, ta como "Sophia Coppola".
Paulo ia falar mais alguma coisa, mas ao olhar a "garota" novamente, entendeu o recado.
Ia voltar a falar com ela. Aqueles cabelos pretos iam parar nos dedos dele. Ia ganhar a admiração dela como ela ganhou a dele.
Aquele nome na parede perto da mesa, podia ajudar...Ele pensou: "Jorge Furtado...Jorge Furtado...Vou procurar no Google."

O cinema é admirável, mas infelizmente (ou felizmente) não é real.

Maio/2008.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Última Canção.


Posso dizer que não vivi o prazer dos homens.
Possuí o sentimento dos deuses.
Minhas marcas são só minhas.
Não tive herdeiros.

Poucos amigos de muitos tipos.

Não estive presente em todas as idades.
Usufruí bem (ou não) das coisas

e me preocupei demais.
Devia ter levado a sério as situações exatas.

Arrependimento? Acho que nenhum. (será?)

Agradecimentos? Milhares...

Desejos? Olhares.

Sonhei demais.

Realizei de menos.

Torço para que esses versos fiquem somente no papel por muito tempo.
Quero viver ainda.
Essa é a primeira
das minhas últimas canções.


Fevereiro/2007.