sexta-feira, 27 de junho de 2008

Tentação




Larga o meu cabelo
e puxa as minhas pernas.
Não é no rosto que impera
a verdadeira emoção.
Com os olhos fechados
eu vejo.
Com a boca aberta
eu não grito.
Minha alma estática.
E nossos corpos
se unindo.
Profana o meu lençol.
Machuca a razão.
Não há soberania.
Não há respiração.
É o fogo do inferno
que me leva até o céu.

Junho/2008

terça-feira, 24 de junho de 2008

Mutação



Coloco minha calça de ginástica preta,

meu moleton amarelo

e meu lenço azul.

Com uma vassoura na mão,

varro um chão sujo de incertezas,

acumuladas,

que carecem de atenção.

Aquela caneta,

que eu escrevi minhas melhores poesias,

eu esqueci debaixo da cama,

ela não pega mais.

Eu achei uma lagartixa na minha mochila

e num instante

quase a matei.

Se fossem outros tempos, tentaria afogá-la.

Pela primeira vez, eu vejo nuvens e não telhados.

“Prefiro não ter janela”

E a cama me chama para ficar mais um pouco.

É nela que se faz as melhores coisas.

Termino a faxina,

Coloco a melhor camisola,

Meus brincos de brilhante

E o perfume de flores de varanda.

E a lagartixa,

Vira camaleão.


Junho/2008.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Saudoso Feriado.



“Ainda vivenciou o início do alvorecer geral do dia lá fora, além da janela.”

Franz Kafka – A metamorfose.


É angustiante acordar, tocar o lençol nada macio e não encontrar a pele clara que eu gostava tanto.

É feriado. Lembro agora como ela odiava feriados, falava que as pessoas só valorizavam a vida nos feriados, só por que o comércio não abria, os parques lotavam e o cinema também. Não era pra ser assim.

Faz um friozinho... Ah! Ela não apreciava o friozinho também, não suportava a idéia de “levar casaco, caso esfrie”, ou saía um sol de queimar ou neve bem branquinha. Os extremos.

Não quero sair da cama, não pelo fato de talvez ainda sentir o cheiro dela no colchão, afinal de contas, já faz um ano que ela foi embora, mas por preguiça mesmo...

Ah não, ficar nessa cama ainda mais nesse feriado, é depressivo demais.

É triste demais.

A pilha de filmes ainda está do lado da televisão. Não desarrumei desde que ela saiu daqui. Está por ordem de preferência, o primeiro sempre foi O Carteiro e o Poeta, em seguida, Laranja Mecânica. Eu falei, sempre os extremos.

Sento na escrivaninha, as folhas de redação com milhares de histórias na minha frente. Lembro como ela adorava opinar sobre as redações, com a fala meio cantada, ela dizia: "Achei muito bom, descreveu com intensidade a essência do personagem, altamente simbolista..."

Era uma troca divertida, eu tentava avaliar as pinturas dos alunos dela e ela lia com a maior vontade as criações dos meus.

Abro a gaveta, acho uma foto nossa junto com as canetas. É do Natal de 2003, o cabelo dela estava meio preso, meio solto. Impressionante como os coques não duravam nem 10 minutos graças à finura dos fios, eles eram tão lisos...meus dedos sempre escorregavam neles.

Sei lá...ainda escuto os passos dela de vez em quando. Na verdade, tenho a impressão de que ela ainda tem a chave dessa casa, mas não me avisa, para não me deixar tão triste. Tudo acabou de uma forma tão inesperada.

Ao viver a minha vida, sigo com precisão aquela frase: “A ação é inimiga do pensamento”, é de um filme, Nicole Kidman mais Anthony Hopkins, eu não lembro o nome, ela era responsável por essa parte, eu só sabia os atores.

No entanto, é impossível não pensar nela hoje.

Tenho que sair, daqui a pouco escurece e vai ficar difícil encontrá-la no meio de tanta gente.

Preciso comprar flores, ela adorava tulipas.

Vermelhas.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

É o amor.


É o prazer de sorrir pela manhã
ao preparar um café na primavera.
É a alegria de deitar na grama
e receber chuvas de flores.
É a simplicidade de sentar
no banco do ponto de ônibus
e ver crianças brincando no jardim.
É a satisfação de ler
páginas envelhecidas
e melhor,
poéticas.
É a razão de ver as horas
e depois,
parar os ponteiros.
É o arrepio da mão fria
ao tocar a cintura quente.
É a dúvida gostosa
de ligar,
ou aparecer pessoalmente,
de fazer pipoca,
ou chocolate quente.
É a proteção
e a felicidade
de sentir o coração bater forte
em um abraço sincero.
É a coragem
que rompe o comum,
num pisco de olhar.
Que sentimento bonito esse, não?
É...



o "amar".

Junho/2008.

domingo, 8 de junho de 2008

Atos e fatos.


Eu gosto
quando você prende o cabelo desse jeito...
Assim,
sua nuca pede meus lábios.
Depois de tantos olhares,
fico surpreso ao me deparar com o seu.
Não tenho carro
não tenho diploma.
Tenho uma voz rouca
e pilhas de folhas de caderno
Aliás,
elas aumentaram depois daquela noite.
Não te liguei,
você também não.
Somos dois solitários
que compartilhamos solidão
em uma fila de teatro solitária.
A arte nos dá certa coragem.
Senti o tremor do seu corpo
quando toquei em suas mãos.
A peça já saiu de cartaz
e meu telefone ainda não tocou.
Mas enquanto houver arte...
Por você,
eu sentirei amor.

Junho/2008.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Antítese.



Direita, esquerda.
Esquerda, direita.

Direita forte
Esquerda branda
Esquerda sua
Direita voa
Esquerda dá
Direita compra
Esquerda bebe
Direita come
Bares direitos
Botecos esquerdos
Aroma direito
Cheiro esquerdo
Inferno esquerdo
Céu direito
Jovem direito
Brasileira esquerda
Vidros, fechados, direitos.
Buzinhas, faróis, esquerdos.
Verde direito
Vermelho esquerdo
Curta esquerda
Longa direita
Amantes direitas
Amores esquerdos
Logística direita
Espontaneidade esquerda
Ternos direitos
Camisetas esquerdas
Whisky direito
Molotov esquerdo
Carteira direita
Assinada esquerda
Barriga direita
Mente esquerda
Relatório direito
Poesia esquerda
Direita Careca
Esquerda cabeluda
Gramas direitas
Flores esquerdas
Piscina direita
Oceano esquerdo
Desenhos direitos
Rabiscos esquerdos
Perder direitos
Salvar esquerdos
Direita MATA
Esquerda...
TAMBÉM.

domingo, 1 de junho de 2008

Onde está você?


Pego um lápis tão simples
para escrever nossas histórias.
Coloco uma música calma,
e espero você chegar.
Você chega...
e desliga o rádio,
tira o lápis da minha mão
e fecha o meu caderno.
Afasta o cabelo do meu rosto.
Sua mão é tão quente...
ou é o meu rosto que é muito frio?
É madrugada.
Sua voz ecoa pela sala:
"Vem comigo."
Meus pés obedecem.
O corredor é tão longo...
ou sou eu que ando lentamente?
O som da porta é áspero.
E a luz ilumina o meu mundo.
A cama de solteiro
é pequena demais pra mim.
e grande para nós.
A luz se apaga.
A porta está fechada.
e você...
não esta aqui.

Junho/2008