segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Casa Nova





-Mãe, cadê o papai?
-Oh, meu amor, ele ainda está viajando.
-Mas mãe, já faz um tempão que ele viajou...
-Eu sei, minha linda, mas ele não volta mais, entende?
-Mamãe,eu quero ver o pai.
-Filha, você quer passear? A gente pode ir naquele parque que você gosta.
-O papai vai ta lá?
-Não, amor, seu pai não vai tá lá.
-Não quero ir, mamãe. Onde o pai tá?
-Filha, você quer falar com o papai? Você pode falar com o papai, só não dá pra ver ele, entendeu?
-Entendi. Eu vou ligar pra ele, mamãe?
-Ai, Meu Deus. Faz assim, olha para o céu e fala com o seu pai que ele vai ouvir.
-Mãe, quem tá no céu é o papai do céu, não o meu pai.
-Filha, ele tá junto com o papai do céu.
-Mãe, ele não vai escutar...o céu é muito longe, mamãe.
-Vai sim, filha.
-Se eu pedir pra ele voltar, ele volta, mãe?
-Minha linda, ele não volta mais, ele agora mora lá.
-Mamãe, céu não é casa, mãe.
-Filha...só acredita em mim,tá? Por favor.
A filha olha para a mãe desconfiada, suas mãos escorregam e param na corrente da mãe.
-Mãe, por que você usa o seu colar?
-Ah, filha, foi aqui que o papai do céu morreu, sabe? Ele morreu para ir para o céu e cuidar de todos nós.
-Que nem o papai? Porque você falou que ele tá do lado dele...
A mãe ficou com medo e percebeu o que fizera. Sentiu alivio e ao mesmo tempo medo por não saber como a filha reagiria.
-Mãe, então eu quero morrer também, porque eu quero ver o papai, mamãe.
-Não fala isso, filha. Você ainda tem muito o que viver, meu amor...
-O papai não tinha mais o que viver?
-Filha...
-Mãe, eu quero ver o papai, mãe. Dexa eu ver o papai, mãe.
A menina começa a chorar compulsivamente. A mãe a coloca no colo e tenta acalmá-la. Com o tempo, ela acaba adormecendo.
Seria difícil acostumar a filha a não ver o pai. Ela ia crescer e aos poucos perceber que a saudade não iria cessar, a saudade só seria esquecida.
Um dia você acorda e percebe a ausência em pequenos detalhes.
É hora do almoço e o telefone não tocou. Já escureceu e só tem um prato na mesa. A cama parece maior do que é e você espera o barulhinho da chave aparecer, mas a porta não abre.
Fazer falta. Sentir falta. Chorar pela falta que faz.
A morte dos outros te obriga a viver.

Um comentário: